Artigo: Igor Dias*
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Os ricaços fizeram lobby desde o golpe em Dilma Rousseff, eles têm sede do saneamento brasileiro, querem acumular mais dinheiro as custas da alta na tarifa de água. Os recentes decretos de Lula no Saneamento escancaram essa disputa. É hora de nos mobilizarmos para impedir esse retrocesso.

Desde 2018 existe uma tentativa por parte de grandes grupos empresariais brasileiros de se apossarem da água e do saneamento brasileiro. As alterações no Marco Legal do Saneamento brasileiro foram gestadas por Temer e aprovadas por Bolsonaro. A intenção da lei era somente uma: obrigar Estados e Municípios a privatizar os serviços de água e esgoto.

A antiga lei, que foi promulgada em 2007, foi fruto de muito debate entre trabalhadores, acadêmicos, especialistas e operadores do setor. Ela já permitia a operação da iniciativa privada no setor. Entretanto, a iniciativa privada não investiu na universalização do acesso ao saneamento.

A operação até hoje foi realizada majoritariamente por empresa públicas de saneamento e ainda existe muito a se fazer. Os investimentos necessários em água e esgoto só dão retorno em longos prazos e em comunidades onde existe capacidade financeira de pagamento das tarifas. O grande problema do Brasil hoje é a falta de saneamento em comunidades mais pobres das grandes cidades, em cidades afastadas dos grandes centros e na zona rural. Isso significa que o financiamento da universalização deve ser realizado pensando em desenvolvimento social e não objetivando o lucro.

Entretanto, as alterações do Marco do Saneamento, sancionadas na lei 14.026/2020 pelo governo Bolsonaro, fazem o caminho contrário do problema; obrigam a privatização dos serviços, ao forçar prefeitos a oferece-los através de licitação da concessão do saneamento, uma vez que os titulares dos serviços são os municípios.

Após a sanção da lei, o Governo Bolsonaro vetou um artigo negociado como redução de danos, que dava prazo para as empresa públicas operarem, e ainda editou decretos que pioraram a lei e dificultaram mais as empresas públicas a sobreviverem

Um dos decretos, que demorou 8 meses para ser editado, instituiu prazos curtos de comprovação econômica financeira que são requisitos da continuidade das operações pela lei 14.026/2020.

Tudo isso pode gerar um monopólio privado no saneamento, já que por trás dessas leis, e privatizações decorrentes delas, estão empresas como Iguá, AEGEA e BTG pactual. Elas atuam para minar a concorrência, inclusive do Estado, de olho em investimentos públicos como os prometidos pelo novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

O saldo da lei 14026/2020 é a financeirização da água que já demonstrou ter consequências ruins em casos como os da CASAL (Alagoas), CEDAE (Rio de Janeiro) e SANEATINS (Tocantins), onde foram  observados diminuição da qualidade dos serviços, aumentos abusivos e exclusão das populações vulneráveis. Outro aspecto são disputas judiciais que travam investimentos públicos e inviabilizam o setor, como o caso da privatização da CORSAN (Companhia Riograndense de Saneamento), que é questionada em diversas instâncias.

A polêmica dos decretos de Lula no Saneamento

O Governo Lula, que ganhou as eleições com a promessa de que o saneamento seria público e teria investimento estatal, editou decretos, em abril, que instituíram regulamentações que permitiam a possibilidade de prestação direta, ou seja sem licitação, entre empresas públicas a um bloco de municípios, ao qual a lei 14.026/2020 fazia referência. Os decretos de abril também estabeleciam prazos e metodologias claras para a comprovação da capacidade econômica-financeira das empresas que queiram continuar operando no saneamento brasileiro. Esses decretos fortaleceram as empresas públicas e desagradaram o mercado e as associações de empresas privadas do saneamento que fizeram lobby no Congresso Nacional, e na grande mídia, levando os deputados a sustarem os decretos.

Temendo uma nova derrota no Senado, o Governo reeditou os decretos. Os novos decretos desregulamentaram, mas não proibiram arranjos jurídicos contratuais entre municípios e empresas públicas, como a prestação direta nas microrregiões, onde municípios organizados em bloco e com uma estrutura de governança definida por lei estadual podem ter a prestação direta dos serviços por ente da microrregião.

Os decretos de julho, apesar de abordar e alterar os temas polêmicos, como a comprovação da capacidade financeira, a validade dos contratos precários e a regulamentação das microrregiões, não criaram dificuldades para o saneamento público e ainda não levantaram grandes discordâncias com aqueles que fazem lobby para destruir as estatais e se aproveitar do mercado de saneamento. Entretanto, os decretos também não facilitaram a vida das empresas públicas e destravaram os investimentos públicos.

A batalha está longe de terminar, é necessário que os militantes pelo saneamento básico público e de qualidade se organizem para enfrentar esses inimigos poderosos que têm o capital financeiro, a mídia e parte do congresso ao seu favor. Para que o Saneamento não seja moeda de troca do Centrão e não caia na mão de empresas privadas, que só buscam o lucro, é necessária uma grande mobilização. Para isso, temos que ir além das audiências públicas no Congresso Nacional, temos que fazer audiências públicas nos Estados e Municípios e convocar um grande dia de paralisação nacional, de forma unitária com todos os sindicatos que representam os trabalhadores urbanitários, em empresas de saneamento e de meio ambiente. Só assim poderemos mudar a correlação de forças e garantir água e saneamento para todos no Brasil.

*Igor Dias, dirigente do Stiueg e membro do Coletivo Sindical e Popular Travessia – Goiás