Artigo: Lucas Tonaco*
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HISTÓRICO – Reino Unido essa semana dá passos para reestatizar empresas de água e energia, um sinal vermelho para as privatizações da COPASA e SABESP e um sinal verde para reestatização da ELETROBRAS.

O governo brasileiro tem adotado uma postura cada vez mais favorável às privatizações, visando transferir o controle de importantes setores econômicos para a iniciativa privada. Duas empresas em destaque nesse processo são a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA) e a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP), responsáveis pelo abastecimento de água e saneamento em suas respectivas regiões, entre outras companhias, e também está tentando reestatizar a Eletrobras.

Vamos analisar a situação da Thames Water, no Reino Unido, que serve como um alerta para os riscos envolvidos nesse tipo de processo.Nesta semana final de junho, o governo britânico e a Ofwat, entidade reguladora do setor da água, consideraram colocar a Thames Water sob um regime de administração especial temporário, isso ocorreu devido ao desempenho deficitário da empresa, com problemas como vazamentos, contaminação de água potável e remuneração desproporcional de executivos e acionistas. A empresa enfrentou multas e está sob investigação regulatória – o processo de privatização da  Thames Water, foi feito muito semelhante ao da Eletrobrás e inclusive, também o que estão querendo fazer com a COPASA, SABESP e outras companhias – A Thames Water envolveu o banco Rothschild e a Slaughter & May para capitalização e modelagem.

E o quê deu errado? Com base em informações do Daily Telegraph os controladores tentaram uma capitalização de 1 bilhão de libras para tentar amenizar e recuperar da situação desastrosa, fracassando, e o governo por meio do órgão regulador, simplesmente está contatando acadêmicos, cientistas e especialistas para estudar a nacionalização ou seja, a reestatização.

Por que esse fato é histórico e por que isso acende um sinal vermelho para o povo de Minas Gerais, de São Paulo, e do Brasil como um todo?

Os modelos de privatização ocorridos no Brasil, tanto do setor elétrico quanto do saneamento contam com um “controlador” (grupo) para darem as direções do capital e da administração enquanto a capitalização mais profunda conta com fundos de pensão – a Thames Water, é controlada por um consórcio de fundos de pensões e fundos soberanos, e os relatórios de tais fundos sobre a avaliação econômica e administrativa, demonstram incredulidade com a atual modelagem, ou seja – como o jeito que a companhia está funcionando e o futuro dela, sendo o maior acionista, o Ontario Municipal Employees Retirement System (Omers), do Canadá, com 32%. Ainda no capital internacional: a China Investment Corporation, fundo soberano do chinês, também o Universities Superannuation Scheme, em absoluto o maior fundo de pensões privado do Reino Unido;Conta ainda com a Infinity Investments, uma filial da Abu Dhabi Investment Authority, sendo a  Hermes (Grupo BT) como outro importante acionista.

Aqui no Brasil, a lógica da COPASA é a mesma: fundos de pensão do capital internacional com interesses difusos. Na SABESP, as ações estão em free float, ou sendo 35,1% estão disponíveis na B3 – Bolsa de Valores do Brasil e 14,6% na NYSE – Bolsa de Valores de Nova Iorque, sujeitas mesma engenharia financeira.

No caso da Eletrobras, seguindo a mesma lógica, há até o FGTS como a opção inicial de qualquer brasileiro para comprar ações, e gerida pelo temerário 3G, o mesmo grupo envolvido no maior escândalo financeiro da história do capitalismo brasileiro – o caso Americanas.

Essa situação levanta preocupações sobre as privatizações em discussão no Brasil, especialmente no setor de saneamento e da Eletrobras e é fundamental questionar se a transferência do controle dessas empresas para a iniciativa privada trará benefícios reais para a população e se garantirá a qualidade e acessibilidade dos serviços prestados,  e o impacto social e ambiental dessas privatizações.

O problema dessa estrutura exposta agora pelo caso da Thames Water, passa pela filosofia atual de negócios e dos controladores brasileiros, entre eles o governo, explico: no caso da Thames, mais de 70% da indústria da água em Inglaterra é de fundos de investimento internacionais, sendo essas empresas de capital privado e empresas sediadas em paraísos fiscais. Segundo o The Guardian, desde a privatização, estas empresas acumularam dívidas líquidas de quase 54 bilhões de libras e pagaram dividendos de 65,9 bilhões de libras, ou seja – com uma filosofia de capitação e administração baseadas em controle de EBITDA e uma ignorância absurda sobre a volatilidade com o controle de mercado de capitais, aliados a ingerência sobre o modelo econômico a longo prazo, tudo se resume em diminuir o custo operacional, terceirizar e simplesmente fazer por movimentos de flutuações de ações de curto e médio prazo, atraindo investidores visando altos dividendos e JCP, o que dificulta a estabilidade de investimentos a longo prazo e também as políticas de precificação, ou seja? A saída seja por privatização ou mais entrada do capitão privado (tão quão insistia a falácia da Lei 14026/2020), não resolveu o problema, ao contrário: agravou a ponto do Estado ter que almejar pela nacionalização.

No caso da COPASA,  Citi manteve recomendação neutra, mas elevou preço-alvo de 17 para R$ 22, segundo o analista principal “em função da empresa ter superado as do banco em economias de despesas operacionais, Considerando que a empresa reduza ainda mais os custos, o banco estima que o valor justo poderia ser ainda maior. As iniciativas de redução de custos da empresa foram bem-sucedidas no trimestre mais recente, e eles acreditam que a reação do mercado às ações foi justificada” –  ou seja: a diminuição do custo (EBITDA) é a questão central na filosofia de negócios, indo no mesmo caminho da Thames – facilitando o descontrole por falta de investimentos e com os investidores privados fazendo movimentos de flutuações em retiradas não com base de questões macroeconômicas de longo prazo e sim, pura e simplesmente no lucro, inclusive por meio da política de JCP e dividendos.

No caso da Eletrobras também são evidentes as preocupações – o descontrole do suspeito Grupo 3G com um modelo de capitalização também descontrolado pode levar o colapso para a economia – uma vez que a empresa é responsável pela geração e distribuição de energia elétrica em todo o país, desempenhando um papel estratégico para a soberania energética nacional, sendo a  privatização da Eletrobras pode levar à perda de controle público sobre esse setor vital, com possíveis impactos na tarifação, na segurança energética e no desenvolvimento socioeconômico do Brasil.

Este cenário é essencial para uma análise crítica e aprofundada das privatizações em discussão no Brasil. A sociedade precisa avaliar se a transferência do controle dessas empresas para o setor privado realmente trará benefícios concretos, tanto para os serviços prestados quanto para a população em geral. É fundamental considerar alternativas, como a reestatização, para garantir o interesse público, a qualidade dos serviços e a soberania nacional no setor de saneamento e energia elétrica.Em um momento em que países como o Reino Unido estão repensando o modelo de privatização de empresas de serviços essenciais, o Brasil deve aprender com essas experiências e buscar soluções que priorizem o bem-estar da população e a promoção do desenvolvimento sustentável, que é o contrário que políticos como Zema e Tarcísio estão fazendo no momento. Portanto, discussão sobre as privatizações da COPASA, SABESP e Eletrobras não deve ser tratada de forma superficial, mas sim embasada em uma análise criteriosa dos possíveis impactos e benefícios para a sociedade como um todo, e devemos aprender com os erros, principalmente o dos outros, que neste caso, a lição vem do Reino Unido.

Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU e dirigente do Sindágua-MG