A água é o maior bem do planeta. E a cruzada para controlar o 1% da água potável é o foco das maiores empresas do mundo. Basta ver que a venda da água está nas mãos de gigantes mundiais como Nestlé, Coca Cola, entre outras. Com a escassez global, as multinacionais miram os recursos brasileiros. Cobiçam mais que tudo, nossos aquíferos, mas também nossas estatais, fazendo passar as boiadas, derrubando todas as leis protetivas que restam em nossas Constituições e assolando as companhias públicas.

Os interesses econômicos têm seus fortes aliados nos governos e parlamentos para defender suas intenções em troca de favores.  Como ocorreu na assembleia gaúcha em agosto passado, autorizando a venda da Corsan a pedido do ex-governador Eduardo Leite, que saiu do cargo e deixou agora a tarefa para o seu vice, Ranolfo Vieira Júnior para dar cabo da companhia na bolsa de valores. O governador atual afirmou essa semana que o mercado é que vai decidir a privatização. A Corsan precisa de gestão e não de privatização.

Para que existe governo se não para defender o que é dos gaúchos? Mas pelo contrário. Após a aprovação da privatização da Assembleia, seguiu a voracidade em atropelar os municípios para que autorizem a venda de suas ações. Até dezembro, 74 dos 307 atendidos pela Corsan autorizaram. Até 31 de março outros 32 se somaram, alcançando 34% do total atendido pela estatal, mas com um conjunto de irregularidades que não se sustentam nas instâncias legais.

Como um governo pode dizer que o mercado manda numa companhia que ainda é pública? Que prova maior da subserviência de governos e de suas parcerias com o capital e seus lucros? O que manda, sabemos, é o interesse do governo em entregar esse setor às empresas em troca de ganhos que as candidaturas a cargos eletivos deixam explícitos.

Por isso protestamos, demonstramos o equívoco, provamos com documentos, estudos técnicos e análises que a Corsan tem capacidade técnica, econômica e administrativa de manter a qualidade no saneamento público, cumprindo as leis, sem ser vendida, sem ser entregue para exploração de empresas que só querem lucrar sobre um patrimônio construído com os recursos dos gaúchos há 56 anos. É nosso dinheiro pelo ralo e lucro no bolso dos exploradores.

A Agergs acaba de confirmar e avaliza o equilíbrio econômico-financeiro da Corsan. Assim como os estudos técnicos do Fórum em Defesa do Saneamento.

É inocente acreditar que as empresas estejam interessadas em ter menos lucros para que as pessoas bebam água boa ou queiram cuidar do ambiente com captação e tratamento de esgoto ou acomodar com cuidados os resíduos sólidos. O capital é grosseiro e ofensivo, disfarçado de bonitinho. Empresas visam o lucro. Os Estados são vocacionados a proteger o bem-estar dos seus habitantes. Porém, quando os governos de ocasião manejam os Estados para servir seus interesses pessoais eleitoreiros tudo se transforma em negócio, em mercadoria, em toma lá, dá cá.

Os grandes grupos econômicos estão fortemente aplicados em abocanhar as companhias estaduais de água nas bolsas de valores.  A pesquisa “Quem são os Proprietários do Saneamento no Brasil?” mostrou os cinco maiores grupos econômicos atuantes na área de saneamento no Brasil que em 2018 já controlavam 85,3% do total de contratos. BRK Ambiental (ex-Odebrecht Ambiental), Aegea Saneamento e Participações, e Iguá Saneamento estão entre eles. A BRK Ambiental pertence ao fundo de investimento canadense Brookfield. A Iguá é formada exclusivamente por fundos financeiros – FIP Água (63,48%), FIP MAYIM (24,01%), BNDESPAR (10,89%,) Cyan (1,55%), IG4 Water Investments (0,08%). Por fim, a Aegea é formada pela construtora Equipav, que detém 70,72% das ações, pelo fundo soberano de Singapura, GIC, com participação de 19,08%, e pela Itausa, holding dona do Itaú Unibanco, que detém 10,2% da empresa.

Não cuidar dos bens coletivos, da saúde e dos direitos da comunidade que os elegeram, é uma distorção. Um crime contra a vida. Discursos ou caras palatáveis não garantem água de qualidade, que é também saúde.

É disso que tratamos. A Corsan ainda é pública. Ainda é possível conter parte da boiada do oportunismo político e achaque privado. Continuaremos nas instâncias públicas defendendo o direito dos gaúchos de ter saneamento de qualidade com controle público e peleando também nas instâncias jurídicas, derrubando irregularidades, denunciado as ofensivas dos saqueadores dos bens naturais.

Além das guerras por petróleo, por minérios, por poderio bélico, entre outros, o grande ouro é a água. Essa é nossa maior luta, porque é uma luta de todos, uma luta pela vida.

Arilson Wünsch – Presidente do Sindiágua/RS