Depois de uma longa batalha que se arrasta desde o ano passado, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região de São Paulo (TRT-2) deu aval favorável aos trabalhadores da Comgás em julgamento de dissídio. Ficou firmado reajuste salarial pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2,86% e R$ 500 de abono. O reajuste é retroativo a junho de 2018, data-base da categoria.

A audiência final que estabeleceu a vitória dos trabalhadores no dia 17 de janeiro teve como mediador o vice-presidente judicial do TRT, Rafael Edson Pugliese Ribeiro. A empresa deve cumprir decisão judicial a partir de fevereiro.

Presidenta do Sindicato dos Trabalhadores da Produção, Transporte, Instalação e Distribuição de Gás Canalizado do Estado de São Paulo (Sindgasista), Deise Capelozza relata as dificuldades estabelecidas pela empresa.

“Durante todas as nossas tentativas de acordo ficou nítido que a Comgás entende negociação como ganho parcial e, neste caso, que só ela deve sair ganhando. Isso ficou claro ao longo das tratativas, quando a empresa rebaixou uma das propostas que ela mesma havia feito anteriormente, rasgando o compromisso com os trabalhadores de garantir a data-base da categoria. A cada momento trazia uma coisa diferente que impedia que a negociação tivesse êxito”, afirma.

A intransigência da Comgás apontada pela dirigente é confirmada pela decisão final expressa no acórdão do TRT-2. Os desembargadores, inclusive, apontam a irresponsabilidade na postura da empresa – já que se trata de serviço essencial à população – que levou os trabalhadores à realização de uma greve.  Um dos trechos do julgamento afirma que “a argumentação da empresa é um flagrante da sua disposição em manter os trabalhadores sem reajuste.”.

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Os dirigentes sindicais, contudo, lembram que enquanto a empresa dificultava qualquer possibilidade de reajuste nos salários de seus funcionários, os preços públicos – como é o caso do gás –  continuaram tendo reajuste para a população, fato também destacada pelos desembargadores no acórdão final.

Além disso, o lucro normalizado da Comgás em 2017 subiu 38,3% em relação a 2016, chegando a R$ 767,6 milhões, de acordo com informações de fevereiro de 2018 que a empresa disponibiliza em seu portal na internet.

“Tentaram justificar nas negociações que existe uma crise econômica atual, mas o lucro milionário da Comgás prova que não há razão de não existir reajuste aos trabalhadores. A rentabilidade da empresa continua a mesma. Sem falar que os cinco diretores da empresa tiveram reajuste em seus salários-base de 4,3% em 2018. Enquanto para os 980 dos trabalhadores a empresa oferecia apenas 1,8% de reajuste”, fala o diretor de Assuntos Jurídicos e Previdenciários do Sindgasista, Artur Risso Neto.

Greve reconhecida

No final do ano passado, quando os trabalhadores perceberam que a empresa não faria os reajustes nos salários após reuniões consecutivas que não avançavam, eles resolveram fazer uma paralisação para pressionar a Comgás, em 28 de dezembro, após assembleia da categoria.

A empresa entrou com interdito proibitório devido às paralisações na unidade, concedido num primeiro momento pela Justiça para impedir novas paralisações deliberadas pelos trabalhadores nos últimos dias 4 e 11 de janeiro.

Mas, quando a negociação foi levada ao TRT-2 em julgamento de dissídio, os desembargadores decidiram que não houve abusividade da greve e, segundo eles, nenhum avanço aconteceria se os trabalhadores não tivessem cruzado os braços. De acordo com julgamento final, a empresa a todo o momento protelou a revisão salarial, manteve posturas intransigentes na negociação, prorrogando possíveis soluções.

Consultada sobre a decisão do TRT-2 e se irá ou não recorrer, a Comgás afirma que não irá se manifestar sobre o tema neste momento.

Intransigência da Cosan

A Comgás foi aberta ao capital privado em 1996 e, desde 1997, suas ações estão listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

Como distribuidora de gás natural canalizado do país, a Comgás é a maior no setor. A Cosan, um dos maiores grupos privados do Brasil, detém atualmente 79,88% do capital social da Comgás e, desde 2012, exerce o controle compartilhado da empresa.

De acordo com o sindicato da categoria, desde que a Cosan assumiu o controle da empresa, conflitos permanentes passaram a acontecer durante as campanhas salariais dos trabalhadores. Antes, acordos coletivos eram negociados. Após o controle do grupo, começaram os primeiros dissídios da história da companhia, como os de 2014, 2015 e, agora, o de 2018 que se estendeu até janeiro deste ano.

Diretor de base do Sindgasista, Rafael Magalhães relata que inúmeras são as reclamações dos trabalhadores desde que a Cosan assumiu, sejam interferências no plano de saúde da categoria, assédio moral e adoecimento dos trabalhadores.

Um funcionário da Comgás, que não quis se identificar, afirma que os problemas começaram a acontecer após um ano em que a Cosan assumiu o controle. “Primeiro eles não mostraram o que eram realmente. Depois começaram as demissões sem justa causa, inclusive de pais de família, e as vagas não foram preenchidas até hoje. Isso sobrecarregou o nosso trabalho. A Cosan visa apenas o lucro e não a qualidade de vida do colaborador. Eles sempre falam que é preciso fazer mais com menos e já mostraram que querem acabar de vez com nosso acordo coletivo. Antes tínhamos prazer de trabalhar na empresa, hoje não dá vontade nem de sair de casa”, conclui. (fonte: CUT-SP)

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