Artigo de Lucas Tonaco*
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Assim como no Reino Unido, mais um processo de privatização da água, dessa vez no Brasil, vira caso de polícia: a privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN) é uma afronta ao povo e um verdadeiro atentado contra a soberania nacional. Essa decisão irresponsável e danosa ao interesse público tem sido empurrada goela abaixo da população, ignorando os alertas de especialistas e estudiosos renomados que apontam os perigos dessa medida.

Acadêmicos como Noam Chomsky, renomado linguista e filósofo, têm ressaltado que a privatização de serviços essenciais, como o saneamento básico, é uma tática dos ultraliberais para entregar o patrimônio público nas mãos de empresas privadas sedentas por lucro. Essas corporações agem em busca do enriquecimento desmedido, sem se importar com o bem-estar da população ou a proteção do meio ambiente.Além disso, estudos conduzidos por Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia, demonstram que a privatização de empresas de saneamento pode levar a aumentos abusivos de tarifas, redução da qualidade dos serviços prestados e exclusão dos mais pobres do acesso a serviços básicos. O fato é que a CORSAN está prestes a enfrentar uma catástrofe social e ambiental em nome do lucro desmedido – de tarifas altas a risco de ficar sem água.

A situação é a mesma comparada com Londres, onde a diretora da Agência de Meio Ambiente, Emma Howard Boyd, exigiu a prisão e demissão dos executivos privados que desrespeitaram as leis ambientais. Enquanto Londres luta para punir aqueles que prejudicam o saneamento, aqui no Brasil, o caminho escolhido é entregar o controle de uma empresa de saneamento a interesses privados, que, historicamente, demonstram negligenciar questões ambientais em prol de seus lucros exorbitantes.

A análise técnica apontada por conselheira do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) revela um verdadeiro festival de irregularidades, incluindo omissão do gestor, erros contábeis e vícios no processo de licitação. Não podemos ignorar que isso sugere a existência de crimes licitatórios e atos de improbidade, colocando em cheque a integridade do sistema de justiça do país, isso em um processo que a relatora, conselheira-substituta Ana Cristina Moraes, apontou inconsistências na elaboração dos estudos que estabeleceram o preço de venda da Corsan, entendendo haver subavaliação, entre outras irregularidades. No fim das contas, a CORSAN foi leiloada por R$ 4,151 bilhões, quando vale 7 bilhões e o lance, foi apenas 1,15% acima do mínimo, segundo parâmetros do edital, há absurdos como o bônus de R$ 1 bilhão que o governo do RS pagará, sendo que tal “bônus” parcelas anuais, durante um período de 30 anos, porém o valor do bônus será baseado no desempenho das empresas privadas em cumprir metas de investimento, cobertura e qualidade do serviço e se não cumprir suas metas, elas ainda receberão o bônus, mas terão que pagar uma multa., e pasmem: a própria CORSAN já elevou muito a universalização a qual sob este mesmo argumento de “ineficiência” está consolidado, ou seja, o governo do RS concordou em pagar a uma empresa privada esse bônus de R$ 1 bilhão, mesmo que ela não consiga cumprir suas metas. Isso significa que o governo do RS está, na verdade, pagando para assumirem a CORSAN a troco de absurdamente nada de concreto a não ser a retórica, e o bônus de R$ 1 bilhão é um valor muito alto, e não há garantia de que as empresas privadas conseguirão cumprir suas metas – sem contar que uma série de estímulos fiscais privilegiam a vencedora do leilão que supostamente irá “ter mais concorrência e competitividade”, já iniciando com privilégios do governo. A situação é um filme de terror para o povo gaúcho, correrá o risco de passar 30 anos pagando uma conta mais cara, com serviços de qualidades incertas e inclusive muitas vezes terceirizado, quarterizado ou quinterizado, tal período de exclusividade começa em 2023 e termina em 2053, durante o período de exclusividade, as empresa privada terá a garantia de ser a única empresa a fornecer serviços de saneamento no RS.Isso dá às empresa privada um grande poder de mercado, pois ela poderá cobrar preços mais altos pelos seus serviços e terão menos incentivo para investir em infraestrutura e melhorar a qualidade do serviço.

Quem está por trás, a AEGEA, e o que pode vir pela frente – uma catástrofe para o povo gaúcho:

A Aegea é uma empresa privada de saneamento básico que opera em vários estados brasileiros e muito conhecida por seus vários problemas. A empresa tem sido alvo de várias polêmicas, incluindo o aumento dos preços da água e do esgoto, a redução da qualidade do serviço, a falta de transparência, o favorecimento de interesses privados e a violação de direitos humanos. Uma das polêmicas mais recentes envolvendo a Aegea ocorreu no Rio de Janeiro: contas que dispararam – 100, 200 até 300%, e problemas graves na prestação de serviços. Outra polêmica envolvendo a Aegea, é no Mato Grosso do Sul que venceu o leilão da PPP de Esgotamento Sanitário, proposta pelo Governo do Estado e que enfrenta uma série de questionamentos até mesmo de qualificação técnica, pela ABES (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental).

Entre outras dezenas de casos polêmicos que envolvem os problemas da AEGEA, há aqui a “cereja do bolo” – Operação Sevandija – nome este em alusão a vermes e parasitas – a operação, deflagrado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo, fez com que a justiça chegasse a bloquear valores da AEGEA, por suspeita de pagamentos de propina e fraude em licitação de obras do Departamento de Água e Esgoto (Daerp) de Ribeirão Preto (SP), onde vários executivos foram condenados e também várias prisões na operação. O Gaeco e a Polícia Federal concluíram que a Aegea desviou pelo menos R$ 18 milhões e 330 mil dos cofres públicos.

A força-tarefa solicitou e a 4ª Vara Criminal de Ribeirão Preto determinou o bloqueio da quantia de R$ 18.330.548,87 do grupo Aegea S.A., detentor de 99% das cotas sociais da Aegea LTDA. A Aegea S.A. entrou com pedido de levantamento do bloqueio, mas o pedido foi negado. O bloqueio determinado pela Justiça da Aegea S.A. é o maior já obtido pela Operação Sevandija em termos individuais. Os valores deverão ser, ao final da ação penal, reintegrados ao patrimônio do município de Ribeirão Preto. O Gaeco de Ribeirão Preto propôs a venda antecipada (alienação cautelar) de veículos, bens móveis e animais apreendidos e bloqueados pela Operação Sevandija. O intuito é evitar que, com o passar do tempo, o patrimônio se desvalorize. Nas três fases da operação, foram apreendidos diversos veículos e bens móveis de valor. Entre eles estão 180 cabeças de gado, uma máquina de ordenha mecânica digital, tanques carretas e um trator. Veículos de luxo como um Mercedes-Benz CLA, um Volvo XC60 blindado, uma moto BMW, dois Porsche Cayenne e quatro caminhonetes Toyota/Hilux também sofreram confisco. Só os veículos foram avaliados em cerca de R$ 2 milhões.

A Operação Sevandija é um exemplo importante da atuação do Gaeco e da Polícia Federal no combate à corrupção e em como pode chegar a executivos e negócios mal explicados ou obscuros que lesão ao povo de maneira nociva e neste caso com algo essencialmente importante: água.

A atuação da Aegea tem sido um problema para a população brasileira. A empresa tem sido responsável pelo aumento dos preços da água e do esgoto, pela redução da qualidade do serviço, pela falta de transparência e pelo favorecimento de interesses privados. A defesa da privatização da CORSAN é uma tentativa maliciosa de alguns setores políticos e econômicos de perpetuar a desigualdade social e consolidar a exploração do povo em benefício de uma elite gananciosa, em especial a AEGEA para conjuntamente com a Iguá, formarem o maior monopólio privado de água do país,conjuntamente com o BTG fazendo o lobby pesado do mercado de capitais. É inaceitável que, em pleno século XXI, estejamos retrocedendo e permitindo que o capitalismo selvagem predomine sobre o bem-estar da população e a preservação do meio ambiente. Nesse contexto, é crucial ouvir as vozes daqueles que têm alertado sobre os perigos dessa privatização. O sociólogo Zygmunt Bauman nos ensina que a privatização é um reflexo da “modernidade líquida”, onde os laços sociais são dissolvidos em prol de um individualismo egoísta. Precisamos resistir a essa liquidez social e defender o direito de todos à água potável e ao saneamento adequado como um bem comum, e não como uma mercadoria.

A privatização da CORSAN é uma ação predatória e lesiva – que irá virar caso de polícia e que coloca em risco os interesses do povo e o futuro do país. Devemos resistir a essa agenda nefasta e exigir que nossas autoridades ajam em prol do bem-estar coletivo e da proteção do meio ambiente, em vez de atender aos interesses egoístas de uma minoria privilegiada.

A CORSAN é do povo, e não devemos jamais permitir que ela seja entregue à ganância desmedida das empresas privadas.

Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU e dirigente do Sindágua-MG