Reportagem publicada pela jornal Folha de S. Paulo mostra a agitação dos analistas do mercado com as nomeações no Ministério de Minas e Energia.

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A nova composição do Ministério de Minas e Energia gerou divergência entre especialistas do setor elétrico. Muitos deles comemoram as nomeações, vistas como de perfil técnico e liberal. Outros, porém, têm dúvidas e enxergam a possibilidade de interferência política nas decisões da pasta.

Uma das nomeações consideradas mais controversas foi confirmada nesta quinta-feira (17/1). Reive Barros irá assumir a Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento, uma das divisões mais estratégicas do ministério.

Ele é visto por diversos analistas como uma indicação do MDB, partido que historicamente teve forte influência política sobre o setor elétrico.

Ex-diretor da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e atual presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), Barros é considerado um técnico de qualidade.

No entanto, para especialistas de diferentes áreas, ele representa resquícios de gestões passadas acostumadas a interferências políticas nas decisões do mercado.

No último ano, um projeto encabeçado por Barros foi alvo de polêmica dentro do governo: a realização de um leilão para contratar usinas térmicas no Nordeste. O projeto, que poderá ocorrer neste ano, dividiu representantes de órgãos do setor elétrico: uma parte considera o certame desnecessário, enquanto outros especialistas defendem sua realização.

A escolha do segundo e terceiro escalão do ministério era aguardada com apreensão, principalmente pelo perfil do novo ministro, o almirante Bento Albuquerque —um militar desconhecido no setor.

“Houve uma surpresa positiva com o discurso do ministro, que sinalizou a intenção de rever subsídios e discutir de forma transparente”, afirma Bernardo Bezerra, diretor da consultoria PSR.

No entanto, há preocupação entre especialistas, embora ele seja elogiado pela ótima formação técnica. A questão é que o almirante não acompanhou de perto as principais discussões regulatórias nos últimos anos, e, no setor, tem como especialidade apenas a fonte nuclear.

Uma das escolhas mais aguardadas era a nomeação para o segundo cargo mais importante no ministério, a secretaria-executiva, que ficou com Marisete Pereira. A decisão dividiu analistas.

Ela trabalhou como chefe da Assessoria Econômica no ministério desde 2005. Após passagem por diversas gestões, ela é considerada uma grande executora de projetos e conhecedora dos trâmites internos da pasta.

Além disso, ganha pontos no setor privado por ter coordenado a desestatização das distribuidoras da Eletrobras, avalia Gustavo de Marchi, sócio especialista em energia do Décio Freire & Associados.

Para Cristopher Vlavianos, presidente da Comerc, a executiva também representa a continuidade de discussões regulatórias importantes, como o novo marco do setor elétrico, que foi formulado na última gestão, mas não avançou no Congresso.

Outro analista do setor, porém, relembra que Pereira também defendeu interferências políticas no mercado em gestões petistas.

Um exemplo é uma portaria, de 2016, que regulou o pagamento de uma indenização bilionária às transmissoras de energia, em troca da renovação antecipada de suas concessões. A medida foi fruto de uma mudança regulatória do governo Dilma Rousseff que é fortemente criticada no mercado.

Outro questionamento levantado em relação à composição da nova gestão foi a capacidade de formulação de soluções aos entraves regulatórios do setor elétrico.

“O ministério não está totalmente estruturado. Tem ótimos gestores, executores, mas isso não é suficiente. É preciso alguém que possa formular saídas para os diversos problemas”, afirma Edvaldo Santana, presidente da Abrace (Associação Brasileira de Grandes Consumidores) e, a partir de março, vice-presidente da Electra Energy.

“O ministério não é fazedor de obras como era na década de 1970. O desafio hoje é manter a estabilidade regulatória”, diz ele, que já foi diretor da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Outras indicações já confirmadas são vistas como acenos claros ao setor privado e ao liberalismo. É o caso de Marcio Felix na secretaria de Petróleo e Gás Natural e a continuidade de Wilson Ferreira Júnior na Eletrobras.

Também foi criado o cargo de secretário-executivo adjunto da pasta, que será ocupado por Bruno Eustáquio, que atuou como diretor do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) —outra sinalização de que a gestão está alinhada com pautas liberais.

“As indicações mostram continuidade em relação à gestão passada [do governo de Michel Temer]. A redução dos subsídios no setor e privatizações deverão ser agendas desse governo”, afirma Thais Prandini, da Thymos Energia.

Para Elbia Gannoum, presidente da Abeeolica (associação da indústria de energia eólica), as perspectivas para o novo governo são positivas, mesmo com a perspectiva de corte de subsídios às fontes renováveis.
“Não sinto apreensão na discussão do corte de subsídios. O único ponto é que essa política seja feita para todo mundo. Não é justo deixar [os benefícios] para alguns [como a fonte solar] e cortar para outros”, afirma. (fonte: Folha de S. Paulo)

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