artigo: Paulo César Ribeiro Lima*

Estão em tramitação no Congresso Nacional, dois projetos de lei relacionados à privatização da Centrais Elétricas S.A. – Eletrobras e suas distribuidoras: Boa Vista Energia S.A. – Boa Vista, da Companhia Energética de Alagoas – Ceal, da Companhia Energética do Piauí – Cepisa, da Centrais Elétricas de Rondônia S.A. – Ceron, da Amazonas Distribuidora de Energia S.A. – Amazonas Energia e Companhia de Eletricidade do Acre S.A. – Eletroacre.

A primeira proposição, Projeto de Lei – PL nº 9.463/2018, que dispõe sobre a desestatização da Eletrobras e altera a Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, a Lei nº 9.991, de 24 de julho de 2000, e a Lei nº 5.899, de 5 de julho de 1973, ainda está em tramitação na Câmara dos Deputados.

O PL nº 9.463/2018 prevê que a desestatização da Eletrobras se dará na forma da Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997, e obedecerá às regras e condições a seguir descritas.

A desestatização será executada na modalidade de aumento do capital social mediante subscrição pública de ações ordinárias. O aumento de capital social poderá ser acompanhado de oferta pública secundária de ações de propriedade da União ou de empresa por ela controlada, direta ou indiretamente.

Para a promoção da desestatização, fica a União autorizada a conceder, pelo prazo de 30 anos, novas outorgas de concessões de geração de energia elétrica sob titularidade ou controle, direto ou indireto, da Eletrobras:

  • que tenham sido prorrogadas nos termos do art. 1º da Lei nº 12.783/2013;
  • alcançadas pelo inciso II do § 2º do art. 22 da Lei nº 11.943, de 28 de maio de 2009, que trata da parcela vinculada a 90% da garantia física da Usina Hidrelétrica de Sobradinho, no centro de gravidade do sub-mercado da usina, deduzidos as perdas elétricas e o consumo interno; ou
  • alcançadas pelo § 3º do art. 10 da Lei nº 13.182, de 3 de novembro de 2015, que trata dos montantes de energia a serem contratados que equivalem às parcelas de energia vinculadas à garantia física da Usina Hidrelétrica de Itumbiara, no centro de gravidade do sub-mercado da usina, deduzidos as perdas elétricas e o consumo interno.

A desestatização da Eletrobras fica condicionada à aprovação pela Assembleia Geral das seguintes condições:

  • a celebração de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica;
  • a celebração de termo aditivo aos contratos de concessão de transmissão de energia elétrica; e
  • a alteração do estatuto social.

Para a nova outorga de concessão de geração de energia elétrica são necessários:

  • o pagamento, pela companhia de bonificação, pela outorga de novos contratos de concessão de geração de energia elétrica correspondente a, no mínimo, 1/3 até o limite de 2/3 do valor adicionado à concessão pelos novos contratos;
  • a alteração do regime de exploração para produção independente; e
  • o pagamento pela companhia de quota anual, em duodécimos, à Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, correspondente a 1/3 da estimativa de valor adicionado à concessão pelos novos contratos.

É justamente a alteração do regime de exploração para produção independente que vai gerar o interesse de investidores no aumento do capital social mediante subscrição pública de ações ordinárias e a valorização das ações da Eletrobras, que deverão ser objeto de oferta pública secundária pela União.

Segundo um sócio de empresa comercializadora de energia, a negociação da energia das “usinas antigas” a preços de mercado poderia gerar um excedente financeiro de R$ 11,8 bilhões por ano apenas entre 2018 e 2019¹.

No cálculo, foi considerada a venda de 9 gigawatts médios em energia a R$ 200 por megawatt-hora, contra os cerca de R$ 50 reais que essas usinas recebem atualmente. A venda a preço de custo seria um dos fatores por trás dos fortes prejuízos da Eletrobras entre o final de 2012 e 2016.

Estima-se que a receita da Eletrobras e suas subsidiárias, em razão da mudança de regime, possa ter aumento médio da ordem de 400%, o que tornará a Eletrobras uma empresa altamente lucrativa para seus acionistas. Isso, contudo, representará um grande impacto nas tarifas pagas pelos consumidores.

O PL nº 9.463/2018 também estabelece que a estimativa de valor adicionado à concessão pelos novos contratos de concessão de geração de energia elétrica e o valor da bonificação serão definidos pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, presidido pelo Ministro de Estado de Minas e Energia. A transparência no processo exigiria que esses valores fossem discutidos e definidos pelo Congresso Nacional.

A segunda proposição, Projeto de Lei – PL nº 10.332/2018, visa a equacionar as dificuldades financeiras das distribuidoras. Segundo o Relator da proposição na Câmara dos Deputados, o projeto equaciona a questão da dívida com a Petrobras referente ao fornecimento de combustível, bem como o pagamento pelos custos de transporte e distribuição referentes ao gasoduto Urucu-Coari-Manaus, permitindo a conclusão da desverticalização da Amazonas Energia, com a criação da Amazonas Distribuidora de Energia e Amazonas Geração e Transmissão de Energia (Amazonas GT).

O reconhecimento de custos com aquisição de energia efetivamente suportados pelas distribuidoras do Acre e de Rondônia, por meio da prorrogação dos contratos de sistemas isolados, também será importante para melhorar a situação econômica dessas empresas, viabilizando a transferência do controle para um novo concessionário.

Segundo o relator, contribuirá para esse processo o dispositivo do projeto que concede aos novos concessionários das concessões de distribuição não prorrogadas as condições necessárias para adequar as companhias aos padrões econômicos e de desempenho operacional exigidos pela agência reguladora do setor, a Aneel.

Ele argumenta, também, que a proposição prevê a adequação dos prazos de contratos de fornecimento de energia elétrica aos prazos de contratação do gasoduto Urucu-Coari-Manaus, associada à antecipação de entrega da energia elétrica vendida pela usina Mauá 3 por intermédio de outras térmicas da Amazonas GT, o que promoverá o aproveitamento de toda a capacidade de transporte de gás natural contratada.

Assim, a geração de energia elétrica para suprimento de Manaus será realizada por meio de termelétricas a gás natural, mais econômicas e menos poluentes, reduzindo as despesas suportadas por todos os consumidores brasileiros por meio da Conta de Consumo de Combustíveis, a CCC.

O relator opinou, ainda, pela aprovação das Emendas nº 2 e 17. A Emenda nº 2 busca alterar a redação do art. 8º da Lei nº 12.783, de 2013, estendendo o prazo previsto no dispositivo, de modo que o Estado do Amapá possa licitar a distribuidora estadual, que presta os serviços de forma precária e provisória, simultaneamente com a outorga de contrato de concessão ao adquirente.

Já a Emenda nº 17 altera a data que deve ser utilizada como marco temporal para definição das distribuidoras da Região Norte que atuavam nos sistemas isolados e que teriam direito ao reconhecimento dos custos reais para suprimento de seus mercados, de modo a evitar que as distribuidoras dos estados de Rondônia e do Acre sejam excluídas dos reembolsos.

Essa Emenda também prevê que o reembolso realizado pela Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), relativo aos combustíveis adquiridos para a geração de energia elétrica, seja realizado diretamente ao fornecedor. Dessa forma, segundo o Relator, procura-se evitar que indevida retenção dos valores referentes aos reembolsos acabe criando desequilíbrios indesejados entre os agentes que atuam no setor, colocando em risco a geração de energia elétrica nas áreas afetadas por essa sistemática.

O PL nº 10332/2018 já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado Federal, onde já foi lido Requerimento de Urgência para sua votação. Assim sendo, na primeira sessão deliberativa do Senado Federal no segundo semestre de 2018, esse requerimento poderá ser votado. Isso pode ocorrer no dia 7 de agosto de 2018.

No Senado Federal, a proposição recebeu a identificação de Projeto de Lei da Câmara – PLC nº 77/2018.

Observa-se, então, que há grande pressa na tramitação do PLC nº 77/2018, podendo haver sua votação no Plenário do Senado Federal sem a realização de uma ampla discussão públicas nas Comissões da Casa.

Em suma, o PL nº 9.463/2018 e o PLC nº 77/2018, vinculados a privatizações no setor elétrico, visam a equacionar a questão financeira das empresas e a beneficiar os futuros concessionários privados tanto de geração quanto de distribuição. A mesma preocupação não existiu quando os concessionários eram estatais, o que caracteriza uma assimetria de tratamento que pode ser questionada junto ao Poder Judiciário.

1- Disponível em https://exame.abril.com.br/economia/energia-de-usinas-antigas-pode-gerar-bilhoes-dizem-especialistas/. Acesso em 23 de fevereiro de 2018.

*Paulo César Ribeiro Lima é PhD em Engenharia pela Universidade de Cranfield, Ex-Consultor Legislativo do Senado Federal, Ex-Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e consultor em Advocacia Garcez. É comentarista do Duplo Expresso sobre Minas e Energia às terças-feiras.

Artigo publicado originalmente em Duplo Expresso

 A LUTA NÃO TEM TRÉGUA!

Com a aprovação pela Câmara do projeto de lei (PL) que viabiliza a privatização das distribuidoras da Eletrobras, os trabalhadores da categoria, representados pela FNU – Federação Nacional dos Urbanitários – e o CNE – Coletivo Nacional dos Eletricitários – estão agora no corpo-o-corpo junto aos senadores, na tentativa de sensibiliza-los para rejeitarem o projeto.

É preciso pressionar os senadores a votarem contra o projeto. Para pressioná-los, envie mensagens para seus e-mails, redes sociais (Twitter, Facebook, Instagram). Você também pode telefonar para os gabinetes. 

Acesse aqui a lista de senadores e senadoras.

Faça sua parte e pressione seu parlamentar contra a privatização das distribuidoras Eletrobras.