Privatizar a estatal significará aumentos periódicos e abusivos na conta de luz

artigo: Paulão é deputado federal (PT-AL)

Em determinado período histórico, é natural que muitas coisas se alterem: sentimentos, posições ideológicas e a forma como uma sociedade pensa o mundo. No entanto, há algo que nunca se altera: a cartilha neoliberal para desmonte do patrimônio do povo brasileiro segue sempre o mesmo roteiro.

O primeiro passo, no caso da Eletrobras, parte do próprio governo federal, que a demoniza em discursos e dados maquiados, com ajuda de alguns setores da imprensa, chamando-a de perdulária, ineficiente e prejudicial aos interesses da população. Para fortalecer essa posição, sempre surge um “especialista” no assunto, geralmente ligado a um grupo que se beneficiaria muito com a privatização, afirmando que apenas a iniciativa privada conseguiria gerir bem a empresa.

Essa é a narrativa que o governo tenta impor ao colocar na ordem do dia a MP 814/2017, que altera o marco regulatório do setor elétrico e abre caminho para privatização da Eletrobras. Principal empresa de geração e transmissão de energia do país, a Eletrobras, a partir da orientação dos governos Lula e Dilma, contribuiu decisivamente para impedir o racionamento de energia no país, mesmo diante da maior crise hídrica de nossa história.

A privatização pretendida, na verdade, é uma transferência dos recursos energéticos nacionais para o chamado mercado. Segundo informações na imprensa, a privatização renderia R$ 30 bilhões aos cofres públicos, quando estudos de especialistas do setor apontam que o valor médio é de pelo menos R$ 370 bilhões. Trata-se de uma verdadeira negociata armada por Temer.

É preciso frisar o papel fundamental das distribuidoras da Eletrobras na manutenção do sistema. São milhares de trabalhadores que dedicaram suas vidas à gestão do sistema elétrico no país e responsáveis por assegurar o direito à energia de populações nos rincões mais distantes dos centros urbanos. Com a privatização, a insegurança jurídica do funcionamento das distribuidoras e a garantia de atendimento de regiões menos lucrativas aos olhos da capital podem prejudicar os mais pobres e os que vivem em áreas menos desenvolvidas.

Além dos prejuízos aos cofres públicos, com eventual venda de patrimônio nacional a estrangeiros por preços irrisórios, há um elemento social imprescindível: a compreensão da política energética como um elemento de soberania nacional e um instrumento de desenvolvimento, como foi o caso do Programa Luz para Todos, possível de execução apenas por uma empresa estatal, atendendo a setores mais pobres de zonas rurais distantes sem se deter exclusivamente pela lógica do lucro.

Não se trata de uma luta apenas dos eletricitários. É importante que toda a sociedade esteja consciente e engajada em defesa da importância estratégica da Eletrobras para o país: energia é questão de soberania nacional em vários países, como nos EUA. Além disso, privatizar a estatal significará aumentos periódicos e abusivos na conta de luz sem contrapartidas na evolução do serviço. Este filme os brasileiros já conhecem.

Artigo originalmente publicado em O Globo